Qualquer coisa fora do espírito da graça não pode expressar o coração e a mente do Senhor
A graça de Deus é algo completamente espiritual e não pode ser entendida pela nossa mente carnal. Muitos de nós ainda raciocinamos com a nossa carne. É comum ouvirmos que graça e amor são básicos, mas lei e santidade são profundos, quando o contrário é verdadeiro.
Quando Israel era um bebê, nephios, ele aprendeu a lei (Gl 4.1-4). Portanto, a lei é elementar, ela é o ABC. A carne é lógica e razoável, mas a graça não é lógica nem é razoável, é por isso que você não pode argumentar sobre a graça. Você ouve dez sermões sobre a graça, e o décimo primeiro que ouve sobre a lei o faz esquecer os dez.
Há algo a respeito da graça que você deve ouvir, ouvir e ouvir novamente, porque não é natural, é celestial, é do próprio Deus. O próprio Jesus é a graça. A graça sempre confunde nossa lógica natural e nos leva a pensar segundo a mente de Cristo. Paulo diz que nós temos a mente de Cristo, isso significa que, quando pensamos em linha com o evangelho da graça, expressamos o coração do Senhor (1 Co 2.16). Podemos dizer que manifestaremos o mesmo Espírito que houve n’Ele.
A vontade de Deus é que possamos crescer até a estatura de Cristo. Isso acontece quando contemplamos o Senhor. Quando o contemplamos, somos transformados de glória em glória (2 Co 3.18)
Certa vez, o Senhor planejou pousar numa aldeia de samaritanos, mas eles não o receberam. Essa atitude deixou os discípulos indignados, então Tiago e João disseram:
Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir? Jesus, porém, voltando-se os repreendeu e disse: Vós não sabeis de que espírito sois. Pois o Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las. (Lc 9.51-56)
Infelizmente, alguns como Tiago e João ainda não sabem de que espírito são. O Espírito de Cristo é o espírito da graça. Qualquer coisa fora do espírito da graça não pode expressar o coração e a mente do Senhor.
A atitude dos discípulos é o espírito comum do mundo: “Se alguém faz mal a mim, então eu deveria lhe fazer um mal maior”. Tiago e João queriam trazer julgamento e condenação, mas esse não é o espírito de Cristo. Todas as vezes que você se perceber julgando e condenando, você deve parar imediatamente, pois saiu do espírito da graça de Cristo.
O problema é que presumimos que as pessoas somente vão mudar se ouvirem uma palavra de condenação. Todos vivem debaixo de permanente acusação e condenação do diabo e nem por isso mudam. Se condenação tivesse o poder de nos mudar, o inimigo jamais o faria.
Nós crescemos quando manifestamos o espírito de Cristo. Gostaria de mostrar dois exemplos na vida de Paulo que ilustram o crescimento no espírito de Cristo.
A percepção de si mesmo
Todos nós pensamos que o apóstolo Paulo é o maior de todos os apóstolos, afinal ele escreveu três quartos do Novo Testamento. Suas cartas são repletas de revelações profundas de Cristo. Mas talvez você se surpreenda com a forma como Paulo se percebia. Ele não se via como sendo o maior. Seguindo a ordem cronológica dos livros que Paulo escreveu, podemos ver três afirmações impressionantes que ele fez, as quais mostram o seu processo de crescimento. A primeira está em 1 Coríntios 15, onde ele diz:
Porque eu sou o menor dos apóstolos, que mesmo não sou digno de ser chamado apóstolo, pois persegui a igreja de Deus. (1 Co 15.9)
Paulo colocou todos os apóstolos como sendo superiores a si mesmo: “Eu sou o menor comparado a todos os apóstolos”. Nós o consideramos, e com razão, como o maior dos apóstolos, mas, em sua própria opinião, ele diz: “Eu nem sou digno de ser chamado apóstolo. Sou o menor dos apóstolos”. Ele não dizia isso por causa de alguma falsa modéstia, mas essa era a sua realidade.
O caminho do crescimento na graça é para baixo. Achamos que o correto é sermos iguais, mas a maturidade nos leva a concluir que os outros são maiores do que nós. Crianças gostam de dizer umas às outras: “Você não é melhor do que eu!”
Quando você se relaciona com alguém e tem certeza de que essa pessoa é maior do que você, sua postura é de respeito, honra e consideração. Entretanto, quando você acredita que precisa se relacionar de igual para igual, não conseguirá manifestar o espírito de Cristo.
Por ocasião da Última Ceia, o Senhor se vestiu de uma túnica, colocou um avental e passou a lavar os pés dos apóstolos. Pedro se recusou a permitir que o Senhor o lavasse, mas Jesus lhe disse: “Se eu não te lavar, não tens parte comigo” (Jo 13.8). O Senhor não disse: “Não tens parte em mim”. Se dissesse isso, significaria que Pedro não tinha salvação. Ele disse: “Não tens parte comigo”, significando que não tinha comunhão. Isso é impressionante, porque a religião ensina que nós servimos a Deus, mas o Senhor disse que só podemos ter comunhão com Ele se Ele nos servir. Na sua volta, o Senhor disse que servirá os seus servos (Lc 12.37).
O espírito de Cristo é que Ele, sendo Deus, desceu da glória, vestiu -se da humanidade e serviu. O verdadeiro servo considera os outros maiores que ele mesmo. Depois disso, Paulo cresceu mais no Senhor e então escreveu o livro de Efésios. No capítulo 3, lemos o seguinte:
A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graça de pregar aos gentios o evangelho das insondáveis riquezas de Cristo. (Ef 3.8)
Agora, ele não está mais se comparando com o escopo limitado dos apóstolos. Ele diz que, dentro da igreja inteira, ele era o menor. Eu me conheço e conheço muitos irmãos que não são grandes, mas Paulo diz que é menor que todos nós. E ele nem está se referindo ao seu passado. Ele diz que, no presente, ele é o menor. Quanto mais Paulo crescia, mais ele via os seus pecados. Entretanto, é evidente que ele via tudo isso debaixo da luz da graça e do amor de Deus. Essa percepção do pecado, portanto, apenas amplia a graça de Deus.
Quando chegamos a 1 Timóteo, veja o que Paulo diz:
Fiel é a palavra e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal. (1 Tm 1.15)
Ele cresceu na graça de Deus, mas parece que, quanto mais ele avança, mais vê que não é perfeito. Contudo, não pare nesse ponto. Se você parar aqui, ficará em desespero. Na graça, quanto mais você vê o seu pecado, mais entende como foi perdoado.
Você não deve viver debaixo de condenação, mas isso não significa que você não possa mais se avaliar ou aceitar ser avaliado. É possível perceber as próprias deficiências e pecados e ainda assim ter completo descanso na graça e no perdão do Senhor.
É verdade que hoje não dizemos que somos pecadores. Nós somos santos, fomos salvos e justificados. Isso, porém, não significa que eu tenha perfeição sem pecado. Mesmo sendo justos, ainda há pecado em nossa carne. Perceber e admitir o pecado não é cair no desespero da condenação, mas é engrandecer a graça de Deus, magnificar o seu amor.
Quanto mais você crescer, mais será como o apóstolo Paulo. Primeiro, ele diz: “Sou menor do que todos os apóstolos”. Então, ele ampliou para todo crente: “Eu sou o menor de todos os santos”. Depois que cresceu um pouco mais no Senhor, ele disse: “De todos os pecadores, eu sou o principal”. Ele exaltou a graça de Deus.
Perdão e juízo
Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males; o Senhor lhe dará a paga segundo as suas obras. Tu, guarda-te também dele, porque resistiu fortemente às nossas palavras. Na minha primeira defesa, ninguém foi a meu favor; antes, todos me abandonaram. Que isto não lhes seja posto em conta! (2 Tm 4.14-16)
Num primeiro momento, parece que Paulo está assumindo uma atitude diferente do espírito de Cristo. Ele diz a Timóteo que Alexandre Latoeiro lhe tinha causado muitos males e por isso Deus lhe daria a paga. Entretanto, não foi essa a atitude de Cristo na cruz. Depois de ter sofrido tudo, o Senhor disse: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23.34). Também não foi a atitude de Estêvão diante daqueles que o apedrejavam. Ele disse: “Senhor, não lhes imputes este pecado” (At 7.60). Ele demonstrou o mesmo espírito de Cristo. Apesar disso, parece que Paulo estava pedindo a Deus que pesasse a mão sobre o tal Alexandre.
A verdade, porém, é que Paulo tinha o mesmo espírito de Cristo e de Estêvão, ele não guardava nenhum tipo de ressentimento. Tudo fica claro quando lemos o verso 15 e descobrimos que a indignação de Paulo, na verdade, era porque a mensagem do evangelho estava sendo resistida. As palavras de Paulo, a que ele se refere, obviamente apontam para a sua pregação do evangelho da graça. Se alguém resiste ao evangelho, precisa mesmo receber a paga de Deus. Paulo diz que o latoeiro havia resistido à sua mensagem.
Depois, no verso 16, Paulo se refere especificamente àqueles que o abandonaram. Ninguém ficou do seu lado quando enfrentou os detratores, mas ele expressa a atitude de Cristo quando diz: “Que isto não lhes seja posto em conta!” Se alguém faz algo contra mim, já está perdoado, mas, quando produz dano ao evangelho, então sofrerá a paga.
Nesse evento, vemos claramente a atitude de Paulo para com a defesa do evangelho e sua postura para consigo mesmo. Quando alguém resiste à pregação do evangelho, constitui-se inimigo de todos os homens. Quando a mensagem é resistida, isso significa que pessoas deixarão de ouvir e por isso não serão salvas. Assim, tais opositores devem receber a paga. Contudo, quando a ofensa é contra ele mesmo, a atitude de Paulo é de perdão e esquecimento.
Fonte: 21 Dias contemplando a Cristo — Pr. Aluízio Silva
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